terça-feira, 22 de novembro de 2011

Quando as cores não surpreendem



Eram muitas, muito vibrantes, vibrantes de muitas cores, daquelas cores que vibram mais por dentro. Violentamente mal percebidas. De repente, rosa caiu e de súbito já não haviam tantas outras cores ao seu redor. Só ela, ali.
Uma rosa, vermelho vibrante, em meio ao branco congelante da neve. Impossível não perceber a beleza poética, paradoxal e contrastante de um vermelho em meio ao branco. Mesmo assim, rosa permanecia lá, sem que percebessem.
É porque se trata de muita neve, e mesmo que essa composição de cores paradoxais cause impacto a qualquer olhar, a qualquer coração, quando se está no meio de imenso deserto de neve, congelantemente branco, não existe olhares, nem corações que assistam a qualquer espetáculo natural.
Quando se está em meio a neve, ao branco frio, não se sente a morte chegar,não se sente o vibrar se amornar, se ir, se emudecer, não se sente o grito rasgar a garganta, não se sente a primavera passar, de outono só as folhas secas e amarronzadas e mesmo assim já se foram, de verão nem o calor. Quando muito, apenas se vê um filme de primaveras que não foram, mas bem que podiam ter sido, ou cenas mal talhadas de primaveras idas, mas primaveras idas não dão cor, nem cheiro.
Foi assim com rosa, de tanta neve se foi, sem se sentir, se é que tenha sido em algum momento. E ficou-se ali, até que chegasse a hora - certa de que todas rosa seca, murcha.Foi-se indo, sem dor, sem expressão, apenas indiferente, como se nada ali pudesse alcançar sua magnífica forma de ser, superior até à dor. E sua hora chegando, aquela hora que não faz a menor diferença a quem mora no branco cortante.
Quando essa tal hora chegou, tinha 13 anos. Treze anos tinha Rosa, mais nova de 10 irmãs, de mesma sorte sua, de primaveras que se confundiam a efêmeros infernos. Da mesma sorte de sua mãe, a quem jamais agraciou olhares com sua plenitude de cores paradoxais, fortes demais a ser percebida por qualquer olhar sem poesia.
Rosa foi indo-se ali mesmo, onde passou boa parte de sua abreviada vida, no semáforo, do cruzamento mais movimentado da cidade. Chumbo que lhe atravessou, varria a cidade das cores que não lhe cabia. Das mãos de um homem sem cor, a quem antes desfrutou da aveludada e negra cor de Rosa.
Jamais suas cores vibrantes voltarão a incomodar os olhos das santas moças que a desprezavam, dos santos rapazes que a possuía a noite (quando o dia então, esfumaçasse o prazer retirado/roubado ofegante dela). Transformou-se em rio vermelho à meia noite, claro, na noite serena, para não virar fato.
Fez-se vermelho, vibrante como só o vermelho pode ser, vibrante e silenciosa. Silenciosa morte que não se sente. Morte que não se vê. Assim, foi deixando de ser Rosa, devagarzinho, despercebidamente, assim como veio.

Sarah Fontenelle

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