segunda-feira, 20 de junho de 2016

Momento zero I


Satan e Metatron retornaram seus olhares para trás. O Duque de Copas, ou o que poderia se chamar dele, mais próximo de um 'Neo Satan', e eu, estávamos mais afastados, porém acompanhamos o movimento de retorno. A luz naquele exato instante estava bem forte. O inferno tem seus espaços de fogo e lava, mas muito longe das pradarias que nos encontrávamos. As trevas e o frio eram quase tudo na esfera de Cocytus. Mas a luz, que parecia o resplandecer da armada celeste, ficava mais intensa, parecia movimentar-se, próxima e mais próxima. Pouco a pouco a luz se desvendou em chamas: tochas e fogueiras feitas pelas milhões de pessoas que se localizavam no inferno e caminhavam para a entrada do palácio de Cocytus.

O inferno sempre fora bastante povoado, com algumas leis universais que só traduziam a vontade de carnificina e diversão do seu regente. Sempre foi um coletivo de pavor, terror e medo. Humanos não andavam lado a lado, eram sempre divididos, dilacerados, sempre com tensão pelo pior. Até porque conviveriam com a estigma do castigo mais ardiloso e bem pensado pelos agentes do mundo inferior. Aqueles que conseguiam permissões para algum tipo de função, já estavam no mesmo caminho de transformação do Duque de Copas. Mas ali se expressava um fenômeno único, peculiar, jamais visto naquele lugar. Algo que poderia reverter a onda de terror imputada à humanidade, para aqueles que as ordenavam. Satan, no entanto, não se espantava; sequer mudou sua expressão, nem seu tino de sarcasmo:

- Ora, ora. Pelo que vejo, conseguimos mais que adestrar as bestas pecadoras. Grande sábio, por acaso sabe o que é essa romaria? Sabe qual motivo leviano esses seres sem quaisquer inteligência estão a fazer andando como correntes estendidas? Não me conte uma piada sem graça dizendo que é um motim.

- Bem Satan, confesso que nada soube de nenhuma organização para esse intento. Mas não tenho os olhos voltados para cada pedaço de pedra e fogo deste lugar. Espanta-me não saberdes o que está acontecendo. Julga que são bestas, mas estas bestas agora te surpreendes.

- Ora nobre pensador, evidente que conheço  as tais reuniões secretas, de ponta a ponta desse lugar. Coisas de três ou quatro infortunados que sonhavam mais alto que o próprio Deus. Algo irrelevante. E sabiamente lembrado em cada chibatada e açoite. E também conheço o seu olhar, que não tem alcance ou poder como o nosso, mas que não é de forma alguma inexperiente. Lembre-se do porquê de estar aqui.

-  Você sempre me tomou de maneira difusa Satan. Mas sei sim o motivo principal que para cá me trouxe. Para elaborar exatamente os que seus sentidos precisos e objetivos não pudessem captar neste espaço, nas relações e sobre o intrínseco das pessoas.

- E eu sei que é exatamente isso que vocês está fazendo a procurar por algo perdido em seus papiros.

- Mais uma vez, certo.

- Então vamos ver até onde o que você viu e registrou se materializará.


Sócrates jogando poker em Cocytus com Satan

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