Como se fosse um professor de verdade, a abri a porta da sala dos alunos calouros de Serviço Social, da turma de 91, dei boa tarde a todos, disse que era o professor deles, distribui uma lista de papel e pedi que cada um dos novos calouros assinassem seus nomes completos, doando algum dinheiro para garantir a compra de papel e custear as despesas da Universidade e para ajudar nas futuras greves professores exigindo melhores no ensino e defendo a Universidade Pública, comuns naqueles anos. Depois, pedi que todos, de mãos dadas, rezassem um pai nosso. Como era o primeiro dia de aula de todos os calouros, ninguém conhecia ninguém, muito menos os que seriam verdadeiramente seus professores.
Do lado de fora da sala, na porta, algumas colegas como Rosaney Ramos de Assis, “que já tinha sido Cardoso” como ela sempre se apresentava, Ana Claudia da Silva Souza e Paula Francinete Batista e outras que não lembro mais, esperavam na porta para entrarem atrasadas, uma a uma para que eu as mandassem voltar, com autoridade. Todos os novos alunos calouros deveriam ficar pensando “mas como esse professor é durão, chato em sala de aula!” E acho que pensaram isso mesmo da brincadeira sadia imaginada pelo Departamento de Serviço Social junto com o Diretório Acadêmico de Serviço Social.
Depois de tudo combinado, dei início ao discurso informando aos calouros que o Curso de Serviço Social era um dos piores e que se os alunos o tivessem escolhido por se acharem bonzinhos, com desejo de ajudar e transformar os outros, que desistissem porque tinham escolhido o curso errado. De tudo que disse, em meu discurso contra a Ufam, falei uma verdade: “ninguém transforma ninguém, a menos que a pessoa queira e aceite essa transformação para melhor”. Somos apenas um instrumento que intermédia essa transformação! Continuo dizendo isso até hoje!
Disse também que a Ufam era a pior Faculdade que existia (já existiam algumas particulares autorizadas com o mesmo tipo de curso, como a Uninorte, por exemplo) e que o curso era o pior de todos. E eu impostei a voz para dizer que sabia do que estava falando porque eu era professor de metodologia do estudo científico.
- Dá licença, professor. Posso entrar? – pediu uma colega de sala de minha turma, a Paula Francinete Batista, com quem já havia combinado para entrar atrasada em sala.
- Não; não pode, não. Volte... – gritei, espantando a todos os calouros, que de nada sabiam e se assustaram com minha rigidez.
- Mas foi o ônibus que demorou a passar, professor... – tentou explicar a suposta aluna novata, a colega Paula Francinete, enquanto as outras colegas de 36 mulheres e quatro homens – dos quais dois desistiram no primeiro mês de aula.
- Não tenho nada a ver com isso. Amanhã saiam mais cedo de casa e cheguem às 13H30min para assistir a todas as aulas. Depois desse horário, não entrará mais ninguém. É só um aviso para todos os calouros, porque sou professor de metodologia do estudo científico e não vou tolerar essas coisas em minha sala de aula. Onde já se viu. Vá já embora daqui, mude de curso ou não volte mais...
Eu coloquei “as duas colegas de sala” para fora de minha aula. As duas saíram “fulas da vida”, me chamando de professor carrasco, insensível e outras coisas mais, tudo isso porque decidiram contrariar minha ordem, ao sentarem em suas cadeiras. Antes de sair, pedi à Rosaney que apagasse o seu cigarro para não “contaminar” com fumaça as outras colegas não fumantes da sala e nem pelos corredores. Como o combinado, ela apagou e jogou fora o cigarro.
Todos, inclusive eu, de mãos dadas, rezamos um pai nosso pedindo ajuda para a Fundação Universidade do Amazonas continuasse tendo uma vida longa. Todos rezaram, mesmo não sabendo se todos eram católicos. Ao final do trote alegre, divertido e não prejudicial a ninguém, li a lista de doações e chamei uma por uma às pessoas que tinham doado dinheiro e pelo valor, devolvi a todos os alunos calouros. E terminei o trote quando o verdadeiro professor da matéria entrou em sala. Tudo combinado, antes!
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