A construção e o reconhecimento dos conhecimentos, para Paulo Freire, devem ser mediados por processos sócio-político-pedagógicos que primam pela relevância da tomada de consciência sobre o atual estágio de consciência e de compreensão crítica da leitura-de-mundo, do contexto histórico-antropológico que compõe o lugar de influência dessa aprendizagem, dos atores sociais que compõem a dinâmica desse contexto, bem como das relações estabelecidas por esses atores entre si e entre esses atores e as coisas inanimadas sob o controle das relações de poderes forjadas em tais correlações.
O mestre educador parece-nos indicar a indissociável relação entre a construção de conhecimentos e a socialização destes com o poder. Mas o que seria “poder”, nesta apreciação pedagógica? Apreendemos que se trata da capacidade de mobilizar vontades, intencionalidades, interesses e entes, inclusive corpos; que não há poder e não há mobilização de poder sem a mobilização de entes, inclusive corpos; que o domínio de poder implica domínio ou controle, coordenação ou manipulação de entes, inclusive corpos, vontades, intencionalidades, interesses. Quanto maior a capacidade de mobilizar, controlar, coordenação ou manipulação de entes, inclusive corpos, vontades, intencionalidades, interesses, tanto maior é o poder. Refere-se à capacidade de mobilizar, dominar, controlar, coordenar meu corpo, meus entes, minhas vontades, minhas intencionalidades, meus interesses e à capacidade de mobilizar, dominar, controlar, coordenar entes, corpos, vontades, intencionalidades, interesses dos outros. Concluímos que o poder se estabelece nas relações entre entes, inclusive corpos, vontades, intencionalidades, interesses e papéis que os atores sociais escolhem para sua experiência histórica ou, do contrário, estão submetidos à escolha de quem lhe determina uma escolha.
Na reflexão que nos oferece sintetizada em “Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa”, Paulo Freire, revela sua escolha realizada, bem como nos recomenda semelhante tomada de consciência para escolher tal escolha contextualizada.
A aprendizagem, para o educador nordestino, faz-se em um processo virtuoso, dinâmico, contínuo e retroalimentador, desenrolado em um ciclo infinito de início, processamento, síntese, aplicação e (re)início, em cujo movimento a história de vida pessoal e profissional do(a) educador(a) e do(a) educando(a) é um dos fatores determinantes.
Dialeticamente, a aprendizagem enraíza-se no espaço fora da sala de aula, processa-se no seu interior e, provavelmente, sintetiza-se e se aplica fora e dentro desta, predominantemente subordinada à experiência de vida de cada educando(a) até então, combinada à sua visão de futuro e seus projetos de vida e buscas, inter-relacionada (mas não condicionada) com os mesmos aspectos subordinados à experiência de vida do(a) educador(a).
A sala de aula é o lugar físico, político, cultural, contraditório e institucional onde o(a) educador(a) disponibiliza, explícita e/ou veladamente, suas verdades sobre o mundo concreto, sobre o mundo das idéias e sobre outros componentes de seu imaginário e da subjetividade coletiva, sob seu olhar, através da operação sócio-pedagógica dos conteúdos, da metodologia e técnicas de ensino de sua escolha possível, dos recursos didáticos que apóiam sua abordagem, do grau de sua habilidade com a arte da comunicação interpessoal e de seu nível de motivação com a disciplina e com o grupo, nunca neutro ideologicamente sobre o modelo de sociedade e do tipo de ser humano e político que se intencionaliza construir-se e oportunizar a formação do outro.
A sala de aula é o lugar para onde o(a) educando(a) vai à procura de tudo aquilo que pressupõe que o(a) educador/professor(a) irá disponibilizar para oportunizar ou facilitar o alcance de sua busca, em se tratando desse contexto específico.
Os dois personagens, professor(a) e educando(a), encontram-se na sala de aula, a partir de onde suas histórias de vida antes, durante e posterior a esta, influenciam no processo de aprendizagem e no resultado da aprendizagem.
Por conseguinte, a sala de aula é esse lugar de encontro de coisas concretas e imaginárias; de coisas já construídas, de coisas para serem construídas e de coisas para serem desconstruídas; de coisas do interior da sala e de fora desta; de seres humanos; de seres com atributos de educador(a)-educando e educando(a)-educador e, especialmente, da relação e da interpretação da relação de todos esses componentes por onde a aprendizagem se faz, ora iniciando o ciclo de aprendizagem, ora processando, sintetizando, aplicando, ora (re)iniciando o processo, em cujo movimento a história de vida de cada ser humano, no exercício de seus papéis naquele contexto específico e no contexto afora, bem como o significado e a epistemologia de cada componente ali é determinante para a aprendizagem de cada um(a) das pessoas, seja professor(a), seja educando(a).
Freire nos desafia a construir uma pedagogia, enquanto fundamentação teórica e experienciação sócio-política, onde a relação educador-educando é nutrida por uma escolha na qual o educando é reconhecido como sujeito político e histórico digno de ser percebido e respeitado, em sua identidade e sua autonomia, com quem a relação se funda nas contradições dialéticas e na solidariedade. Nesta conduta, o educador refuta, a idéia de conceber o educando como sendo “um homem-lata”, para dentro do qual se deva derramar os saberes “prontos” e “acabados”. Nesta lógica, o poder se alicerça da capacidade de mobilizar vontades, intencionalidades, interesses e entes, inclusive corpos, resultante da construção coletiva, ideologicamente socializada e debatida.
Por fim, nossa apreensão dos sentidos oportunizados com a “Pedagogia da Autonomia” de Paulo Freire, associa-se à coerência de outros termos de reflexões que encontramos em outras obras suas, tais como: “Pedagogia do Oprimido”, “Extensão ou Comunicação?”, “Educação e Mudança”, “O ato de ler”, dentre outras.
Devemos por esse legado.
Por fim, nossa apreensão dos sentidos oportunizados com a “Pedagogia da Autonomia” de Paulo Freire, associa-se à coerência de outros termos de reflexões que encontramos em outras obras suas, tais como: “Pedagogia do Oprimido”, “Extensão ou Comunicação?”, “Educação e Mudança”, “O ato de ler”, dentre outras.
Devemos por esse legado.
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