sábado, 28 de abril de 2012

#ContraoAumentoTeresina







Minhas mãos ainda estão trêmulas e a muito custo que seguro as lágrimas. Meu corpo todo doí e ao menor ruído fico sobressaltada. Estou com os nervos a mil. Tudo que vi hoje, sinceramente me parece uma cena de filme.
Não parece que estou na mesma realidade de dantes, não me sinto no mesmo local, é como se eu apenas visse imagens projetadas em um lugar aparte de tudo. A todo momento ligo pros meus amigos para saber como estão e me espanto quando o telefone toca, sempre me perguntando: Quem dos meus amigos ta machucado ou preso?!
Minhas amigas estão falando comigo, me ligando, pra saber se estou bem, mas não consigo responder direito, porque to chorando agora.
Me sinto uma inútil, como se não estivesse fazendo nada. Sei que estou fazendo o que está ao meu alcance, mas ainda assim me sinto de mãos atadas. Queria poder arrancar as pessoas das mãos do policiais e fazer eles pagarem por tudo. Fazer as pessoas enxergarem tudo que está acontecendo.
Queria dormir, meu corpo pede descanso, depois de tantas dias de caminhada, de sol, de fome e sede. Mas minha mente não deixa. Imagens de mulheres sendo arrastadas pelos cabelos como animais, idosos agredidos, jovens pisoteados e minha própria imagem borrada dos acontecimentos, não me permitem dormir.
Minha amiga acabou de dizer que não vai para o trabalho amanhã, porque não aguenta ver tudo isso que aconteceu hoje e ficar em casa sentada.
Queria que esse sentimento se espalhasse como rastilho de pólvora, ou como o spray de pimenta que jogam todos os dias na gente, em toda a população teresinense.
A forma arbitrária e brutal de como a PM agiu hoje, me deixa de tal forma enojada que até eu me sinto suja. A PM jogando spray e soltando bombas nas pessoas que estavam no Bom Preço, pais de família e trabalhador@s que estavam apoiando o movimento. Meu amigo chega e me diz que um senhor (vendedor de picolé) disse para a polícia que eles não podiam agir daquela forma, que era errado. Não foi preciso mais do que isso pra um deles dizer: "Ah, posso não!? Pois leva logo esse aqui também!".
O estopim de lágrimas veio quando me disseram que uma jovem, atingida no olho por uma bala de borracha, podia ficar cega.
É isso que chamamos de democracia?! Não foi isso que aprendi inocentemente na escola.
A mídia cada vez mais tenta colocar a população contra os manifestantes.
Sou estudante de jornalismo, e por vezes tenho um enorme nojo da profissão. Sabemos que a mídia é comprada, sei também que tem uma galera que depende do seu emprego, sei que tem gente tentando mostrar o outro lado e sei que um dia posso ir parar em um estágio em um lugar como esse. Se for pra fazer um jornalismo assim, sei que vou ter que fazer vestibular de novo ou ficar pra sempre na barra da saia da minha mãe.
Agradeço imensamente aos comunicadores (incluo aqui os fotógrafos, repórteres, blogueiros, "tuiteiros", "faceboqueiros" e independentes de plantão) que estão do nosso lado, mostrando a realidade dos fatos, e não como essa mídia vendida vem fazendo, nos criminalizando e retaliando.
Acabei de chegar do sindicato, onde estávamos (ainda tem gente lá) produzindo notas e matérias e, dentre outras coisas, esperando noticias dos advogados do Fórum (vale um parabéns a eles, que estão fazendo um trabalho belíssimo) que tentavam soltar as pessoas presas, que os policiais tentavam a todo custo mante-los lá, passando por cima de legalidade. Quando o Coronel James Guerra anunciou o preço de 10 salários mínimos pro cada preso, como fiança. Isso não era da alçada dele decidir.
Cada ligação era um susto, cada informação desencontrada era aperto no peito sem saber quem realmente estava solto ou machucado. Nem a cara podíamos colocar do lado de fora, pois tinha policiais rondando o local
Hoje vi um massacre. Da ordem, da democracia, da cidadania, da HUMANIDADE!
Sinto que ainda temos que caminhar, mas nossa luta tenho fé, será vitoriosa.
Tudo isso me deixa enojada, e me faz refletir sobre a conjuntura de tudo, sobre a sociedade que vivemos. Até antes pensei que vivecemos em uma comunidade que chamávamos de CIVILIZADA, mas depois de tudo que tenho visto e vivido esses dias, sinto que na verdade o tempo das cavernas está ditando tudo e dentro de tudo, como um animal acossado que foge loucamente quando arrebentam sua coleira.
Quero poder correr livremente e gritando que conquistamos nosso intento, vamos fazê-lo.
Nojo e sentimento de impunidade, define esse meu momento.
Queria um abraço nesse instante para fugir um segundo dessa realidade, fingir que foi tudo um sonho ruim. Queria dar um abraço em todos os companheir@s que estivem ao meu lado em várias lutas da minha vida, e nessa do ContraOaumento mais ainda. Abraçar aqueles que eu não conheço, mais que estão nas ruas todos os dias, na luta pelo mesmo ideal.
Desculpem se alonguei amig@s, mas senti a necessidade de desabafar.
Existem braços na luta companheir@s!
O meu está lá.
Sem mais forças para escrever.
Abraços.

(Doda Pereira, madrugada de 11/01/2012)

ps: Texto feito na época das manifestações em Teresina contra o aumento da passagem. No dia exato de confronto mais truculento da polícia contra os manifestantes.

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